Monday, September 29, 2008

Cá entre nós
Percival Puggina

Em certo lugar da Suíça, 100 metros abaixo do chão, um grupo de cientistas começou a operar a maior máquina já criada pelo ser humano - o LHC (Large Hadron Collider, ou, em português, Grande Colisor de Hádrons) - que pretende encontrar explicações para a origem e o funcionamento do universo.
Não subscrevo nem renego a teoria do Big Bang porque desconheço seus fundamentos, coisas como o "bóson de Higgs" ou o "modelo padrão das partículas elementares". Meu interesse sobre o tema é de outra natureza. Diz respeito a um universo autocriado ou criado por Deus. A sofisticadíssima investigação sobre o que ocorreu no primeiro trilionésimo de segundo da existência do universo e sobre sua evolução ao longo dos recentes 14 bilhões de anos avança sobre erros e correções de erros. No entanto, convenhamos: conceber toda a não-criada massa do universo concentrada num único não-criado ponto, do tamanho de uma moeda, explodindo em um não-criado espaço-tempo, e
dando origem a tudo, por conta própria, implica um ato de fé. Temos, então, a fé em Deus (fé em um ente criador) e a fé em não-deus (fé em uma criação produzida por um não-ser). Ambas são de natureza e de conseqüências distintas e estão à disposição do leitor.
Pessoalmente, fico com a primeira porque me resolve, e resolve bem, tanto a questão do pontapé inicial quanto inúmeros outros problemas existenciais relevantes, ao passo que a segunda hipótese não me ajuda em coisa alguma. Por outro lado, enquanto a idéia do não-deus serve ao relativismo moral e à permissividade, a idéia de Deus se encaixa perfeitamente com a de que existe uma lei natural, uma ordem moral, a incidir sobre as ações humanas. É ela que nos faz, por exemplo, reprovar a covardia, a traição, a mentira e as várias formas de desonestidade, e a valorizar coisas como o amor, a solidariedade, a justiça, a paz, a ordem e a liberdade. É essa ordem moral que leva a
condenar o roubo e a cobiça às coisas alheias, o assassinato, a inveja, a luxúria e o adultério, a avareza e a preguiça. É dessa lei natural que decorrem, também, a repulsa a toda agressão à dignidade da pessoa humana e a sua vida, da tortura ao aborto.
Por que escrevo sobre coisas assim, quase óbvias? Porque estão se tornando cada vez mais insistentes as investidas no sentido de suprimir do nosso direito certos preceitos alinhados com essa lei natural. Ter convicções fundadas na sua existência, ou coincidentes
com orientações teístas ou religiosas, é tido como intromissão indevida em matérias perante as quais só se aceitam palpites com geração espontânea num big banguezinho ocorrido na cachola de quem os emite. É como se uma suposta inexistência de convicção e uma falta de fundamento das opiniões compusessem a exclusiva senha para ingresso no
privilegiado espaço das deliberações de interesse geral.
Insistem, para além da mera estultice e da simples teimosia, que apenas suas opiniões, em virtude de serem "neutras" e "não contaminadas" por qualquer ordem moral, ou escala de valores pré-existentes a eles próprios, merecem contar com a atenção de todos, configurar o Direito e orientar a Justiça. Cá entre nós: alegação tão descabelada, ou tamanho desvirtuamento ético, só se compreendem como expressão de profunda desonestidade intelectual.
Explicando o inexplicável
Ipojuca Pontes


O ato de censurar é um atentado contra a liberdade de expressão. Segundo Flaubert, o mais exigente de todos os escritores, a censura impõe-se como um crime de lesa-alma, algo pior que o homicídio. Mas o governo Lula não pensa em outra coisa. Nele, a proposta permanente e subversiva, tramada nos bastidores do poder sob qualquer pretexto ou razão, é a de o governo, em vez de ser fiscalizado, fiscalizar a imprensa.
O cuidado é excessivo. De fato, o governo, por meios diversos, já domina cerca de 80% do noticiário, obtendo, no caso do jornalismo opinativo, a submissão de uns 90% (ou mais) dos chamados "formadores de opinião". Mas para o governo petista a "quase totalidade" é pouco - ele quer o controle total da informação.
Agora mesmo, diante do escândalo que aponta a ABIN (Agência Brasileira de Inteligência, órgão subordinado ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República) como responsável pelo grampeamento de aparelho telefônico de Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro da Defesa, Nelson Jobim (em depoimento prestado na CPI do Grampo, no Congresso) sugeriu nova legislação para punir os responsáveis pelo vazamento de informações obtidas em escutas telefônicas - entre eles, os jornalistas que as tornem públicas.
Ao provocar os parlamentares, o Ministro da Defesa foi explícito: "Os senhores terão de prestar atenção não só ao interceptador ilícito, mas também no vazador de informações. Se os senhores não fecharem as duas pontas, vai continuar a acontecer o que está acontecendo".
O tresvariado Jobim não faz por menos: com a adesão do próprio Lula, agora dotado de poderes extraterrestres, pretende liquidar o sigilo da fonte, instrumento básico não só para a consecução do direito de informar à opinião pública, mas da própria sobrevivência da democracia. Na ordem prática das coisas, extinta na atividade jornalística a inviolabilidade do sigilo da fonte prevista na Constituição, só haverá punição para aqueles que divulguem, por imperativo do ofício, os crimes e as falcatruas cometidos (em abundância) pelos que governam o país.
Mas a coisa não fica por aí. Como resposta ao julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) de uma ação em que a atual Lei de Imprensa tem sua constitucionalidade contestada, por excessiva, o governo, por intermédio do seu Ministério da Justiça, enviou ao Congresso projeto de lei para punir jornalistas e órgãos da imprensa que tornem público o conteúdo de escutas telefônicas. Ou seja: a máquina totalitária do governo, reincidindo nas propostas anteriores levadas a efeito pelo Conselho Federal de Jornalismo e pela Ancinav, em vez da enaltecida transparência, quer estabelecer o silêncio pelo ato nefando da intimidação e censura.
Desde que se instalou em Brasília, em 2003, o governo Lula tem sido um colossal repositório de escândalos, sempre envolvido na armação de falsos dossiês, escutas telefônicas, dezenas de denúncias de fraudes, roubos, desfalques, argüição de falsidade ideológica, desvios de verbas oficiais, peculato - na generalidade dos casos sem nenhuma punição aparente. Os intermináveis processos de investigação que arrolam os acusados caminham, em geral, a passo de tartaruga, sendo que um número considerável de denunciados, em vez de castigo, ganha elogios, tapinhas nas costas, homenagens e, segundo o "expert" Anthony Garotinho, generosas "boquinhas ricas" no entorno dos fartos negócios oficiais.
Diante de um quadro assim, tão vergonhoso quanto patético, o que resta à opinião pública nacional mais consciente? Bem, invocando o Dr. Sacher Masoch, respondo: o sofrido, porém necessário direito de saber o que está se passando às suas barbas, se possível pela informação, ainda que incompleta, dos jornais. Claro, o saber-se dos delitos das autoridades governamentais não é uma solução, mas, quando menos, consola. E, por vezes, leva à inconformidade e, daí, à insubordinação.
Pois muito bem: é justamente o restrito consolo de conhecer a triste realidade dos fatos que a máquina do governo quer ver por terra, a partir da ação de Tarso Genro e as palavras de Nelson Jobim. Teria a máquina do governo, de posse de quase todos os instrumentos de repressão, inclusive os fiscais, algum medo (primitivo) da insubordinação do homem comum?
No mesmo instante em que o Ministério da Justiça enviava ao Congresso o seu projeto de lei contra a liberdade de imprensa, o relatório anual da Organização Transparência Internacional dava conta de que o Brasil continua sendo um dos países mais corruptos do planeta, ocupando posição elevada no ranking mundial na decomposição dos negócios públicos. Na variação entre o número zero (muito corrupto) e dez (livre de corrupção), que escalona o grau de corrupção global, o Brasil aparece com 3, 5 pontos, numa lista em que a Somália está catalogada na classificação inversa como dos mais corruptos, com 1 ponto.
Serão necessários mais argumentos para esclarecer a razão pela qual se pretende quebrar o sigilo da fonte e punir jornalistas e órgãos de imprensa que veiculem denúncias captadas nas escutas telefônicas?

PS - Os comunistas, que viviam condenando o PROER criado pelo social-democrata Fernando Henrique Cardoso, o "bom de bico", agora aplaudem, pela mesma razão, o "pacote de Bush" para socorrer os bancos americanos. Os comunistas são capazes de tudo, inclusive de justificar a expropriação do dinheiro dos contribuintes pelos banqueiros enriquecidos a partir da ultra-regulação e a vontade dos burocratas do FED - caso das seguradoras Fannie Mae e Freddie Mac, protegidas pelo paternalismo do Estado ianque. Mas qual é a lógica que explica o cidadão contribuinte pagar pela oferta de crédito fácil dos banqueiros em conluio com burocratas sabichões e compradores irresponsáveis?


Newsletter do MSM 29 de setembro de 2008

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